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Infância e Disforia de Gênero

  • sabrinarp
  • 18 de fev. de 2017
  • 4 min de leitura

Diante das mudanças referentes à classificação do diagnóstico de transtorno de identidade de gênero para o que é atualmente empregado no DSM V como disforia de gênero, pode-se destacar a tentativa de despatologização na mudança do termo, diagnóstico este que descreve os indivíduos que apresentam uma diferença marcante entre o gênero experimentado/expresso e o gênero atribuído, deixando assim de classifica-la como uma desordem ou transtorno mental, já que a palavra “Transtorno” traz consigo uma ideia de doença mental, enquanto “Disforia” é uma palavra menos estigmatizada, que aponta para um sofrimento emocional.

Apesar de nos tempos atuais não ser um fenômeno tão raro, o que se vê ainda é que há diversas barreiras, mitos e preconceitos a respeito da disforia de gênero. Pessoas que se portam diferente daquilo que é aceito como normalidade, são vistas como aberrações humanas, não podendo inclusive, em algumas culturas demonstrar como realmente são, pois correm o risco de ter que exilar-se da família ou mesmo risco de vida.

Registros literários, mitológicos, antropológicos, etc., mostram que o sentimento de pertencer ao sexo oposto ao denominado no nascimento, é tão antigo quanto à sexualidade humana. O que significa que a transexualidade não é próprio nem à nossa época e nem de nossa cultura: o que é recente é a possibilidade de ser feita a redesignação sexual graças às novas técnicas cirúrgicas e a hormonoterapia. Entretanto, este caminho para o Processo Transexualizador exige atenção especial, uma vez que a pessoa necessita ter realmente certeza de que pertence àquele sexo oposto.

Neste sentido é fundamental a detecção precoce para que seja aplicado tratamento integral, proporcionando dessa maneira uma melhora na qualidade de vida psicológica e social, bem como a prevenção de comorbidades que podem associar-se à disforia. Uma vez que o tratamento hormonal interfere no desenvolvimento da puberdade, evitando o sofrimento que pode advir do desenvolvimento das características do sexo oposto ao que o indivíduo se identifica.

Uma das funções do profissional da saúde mental é a realização do diagnóstico de disforia de gênero, como um passo para o tratamento prévio hormonal. Para tanto, o individuo deve entender sua urgência cirúrgica não como algo leviano, mas como um desejo genuíno de transformação com a finalidade de criar um corpo em conformidade com a imagem auto percebida.

A psicoterapia é de suma importância no decorrer do processo, para ajuda­r os transexuais a conviver com as pessoas que os cercam; para terem uma visão mais realista do tratamento cirúrgico a que se submeterão; e para encarar sua vida futura após a cirurgia, uma vez que a maioria vê a cirurgia como algo mágico que fará seus problemas relacionados à disforia desaparecer.

Desta maneira, a família têm um papel fundamental ao perceber que o filho ou a filha se comporta de maneira ‘inadequada’ aos padrões sociais e - uma vez que a decisão de apoiar ou não a redesignação sexual, deve ser muito bem pensada por estes, já que o indivíduo não tem o poder de decidir.

No Brasil, Desde agosto de 2008, a portaria 1.707, do Ministério da Saúde, autoriza o Sistema Único de Saúde (SUS) a realizar o procedimento, sendo que aos 16 anos o indivíduo possa dar início ao processo por meio de tratamento hormonal e quando atingir 21 anos ou mais possa entrar na fila para cirurgia de transgenitalização.

O tratamento não tem como objetivo apenas a saúde física do usuário, mas também permitirá uma melhora no aspecto da inclusão social. O psicólogo desempenha um papel fundamental, considerando que o paciente com esse diagnóstico se encontra fragilizado psíquica, mental e socialmente. É necessário, de acordo com toda a burocracia padronizada, passar por no mínimos dois anos de terapia psicológica. Todo esse processo é de suma importância para a confirmação sobre a decisão, já que a cirurgia é irreversível. Depois de passarem pela avaliação dos especialistas, é feito encaminhamento dos indivíduos para os atendimentos psicológicos em grupo ou individual, além de acompanhamento psiquiátrico, em alguns casos. Somente após o período de dois anos é que o indivíduo é encaminhado para a cirurgia, caso seja atestada sua transexualidade e as condições clínicas que permitam tais procedimentos. Porém, por conta da dificuldade no agendamento das cirurgias, esses indivíduos levam muito mais que esse período aguardando pela realização da cirurgia.

Em relação ao período pré e pós-cirúrgico, a transexualização, sentida como necessária para a maioria dos pacientes com disforia de gênero, é vista como um processo difícil, em que a pessoa, mesmo tendo realizado as cirurgias e a hormonioterapia, não está livre do preconceito e discriminação social. Sendo assim, evidencia-se a necessidade de considerar a transexualidade para além das questões pré e pós-operatória, sendo uma questão mais complexa e danosa a própria representação social sobre a transexualidade, que patologiza e estigmatiza tais indivíduos. Neste sentido, o acompanhamento psicoterápico é uma estratégia de enfrentamento, como alívio para o sofrimento (Sampaio e Coelho 2012).

De acordo com Rodriguez, Mora e Méndez (2013), os argumentos a favor do tratamento médico precoce está voltado para o fato de que a disforia mantêm-se na vidada adulta. Sendo que desde a introdução às classificações diagnosticas da disforia de gênero, praticamente todos os manuais fazem referência a especificidade da infância.

Por fim, é importante ressaltar que dadas as consequências irreversíveis das intervenções hormonais, é absolutamente vital que seja realizado um cuidadoso diagnostico, com diversas avaliações individualizadas. O profissional deverá ter conhecimento e instrumentos necessários para selecionar cuidadosamente os candidatos mais adequados que podem beneficiar-se do tratamento bem como propor outras alternativas terapêuticas que contemplam um leque de possibilidade para expressão de gênero.


Referências:

Franco, Elisângela de Carvalho. SER OU NÃO SER? A DISFORIA DE GÊNERO NA INFÂNCIA: QUANDO O APOIO E A COMPREENSÃO DA FAMÍLIA SÃO FUNDAMENTAIS À CRIANÇA. 2016. Disponível em: < http://estudosculturais.com/congressos/vcongresso/wp-content/uploads/2016/09/ser-ou-n%C3%A3o-ser-a-disforia-de-g%C3%AAnero-na-inf%C3%A2ncia-quando-o-apoio-e-a-compreens%C3%A3o-da-fam%C3%ADlia-s%C3%A3o-fundamentais-%C3%A0-crian%C3%A7a.pdf>


Rodriguez, Maria Fernández Rodríguez; Mora, Patrícia Guerra; Méndez, Mónica Díaz. La disforia de género en la infancia en las clasificaciones diagnósticas. C. Med. Psicosom, Nº 110 – 2014.


SAMPAIO, Liliana Lopes Pedral; COELHO, Maria Thereza Ávila Dantas. Interface (Botucatu) vol.16 no.42 Botucatu July/Sept. 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141432832012000300005>. Acesso em 06-05-2015






 
 
 

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